Quem foi Benoît
Acreditamos que ao se beneficiar de qualquer terapia ou ciência advinda de seu idealizador ou discípulo deve-se sempre, e obrigatoriamente lembrar e reverenciar com gratidão aquelas personagens responsáveis por todas as benesses recebidas. É é por esse intuito que estamos aqui tecendo uma biografia resumida do bandeirante da homeopatia no Brasil, que infelizmente não recebeu aqui na nossa Pátria o seu devido reconhecimento. Por esse motivo iremos trazer aqui um pouco de sua vida ligada a homeopatia e a história da inserção dessa Ciência no Brasil no tempo do Império uma vez que o Instituto tem orgulhosamente seu nome (Instituto de Homeopatia Benoît Mure - IHBM).
Muitas pessoas utilizam-se da Ciência da Homeopatia, sem saber que essa arte de curar tem uma longa história institucional e política neste Brasil. Essa Ciência ao longo dos anos, desde a sua introdução no Pais, tem passado por inúmeras fases de ascensão e queda, mas atualmente está finalmente saindo do ostracismo e alcançando sua verdadeira posição, de onde nunca deveria ter saído. Embora oficialmente a homeopatia tenha sido criada em 1796, por Samuel Hahnemann, ela foi oficialmente introduzida nas Terras brasileiras em 1840, pelo discípulo direto do criador, o Francês Benoît Jules Mure, carinhosamente também conhecido por Bento Mure.
Benoît Mure (Lyon, 15 de maio de 1809 - Cairo, 4 de março de 1858) configura-se como importante figura na história da medicina brasileira e especialmente no que se refere a Ciência
da Homeopatia. A reverberação de sua atuação como bandeirante da homeopatia deixou influências que estão vigentes até nossos dias.
Benoît foi filho de um rico burguês de Lyon, fez seus estudos de medicina em Montpellier (local em que predominava a medicina vitalista).
A guinada e a paixão de Mure pela homeopatia inicia-se pela cura de uma tuberculose pulmonar com tratamento homeopático ministrado pelo discípulo de Hahnemann e introdutor da homeopatia na França, Sebastião Des Guildi. A semelhança do Alemão Constantine Hering, após análise dos fatos, mergulha nos estudos da Ciência homeopática e então começa a professá-la. Após a sua melhora e conversão a homeopatia, começa sua peregrinação pela Europa (Palermo na Sicília, Paris, Cairo e Malta) difundindo a nova arte de curar. Em novembro de 1840, Mure, então com 31 anos, desembarca (barca francesa Eole), no Rio de Janeiro com sua mente inundada de projetos altruístas. Além da homeopatia, Mure, animado pelas ideias de Fourier e Jocotot, funda em Santa Catarina, mais precisamente na península formada pelo Rio São Francisco, uma colônia societária falansteriana, conhecida por Colônia do Sahy.
Benoît e o Império
Em 18 de setembro de 1841, os colonos societários franceses, foram apresentados por Mure (membro oficial da Union Industrialle de Paris), ao imperador Dom Pedro II para expor sua estratégia de ação: "Venho, em nome de todas as classes sofredoras que aspiram em França a mudar de posição, pedir a vossa majestade os meios de gozar, debaixo de um governo tutelar, do fruto legítimo de seu trabalho." (Mure apud. Galhardo, 1928: 280). Aqui, fica patente a atitude e a intenção firme e pujante de Mure e o porquê esse militante expande, mais tarde expande o tratamento homeopático aos escravos desvalidos e aos socialmente excluídos da Pátria imperial. Esse pedido, também explica o motivo do envolvimento dos homeopatas nas lides políticas e sociais do país, cabendo a um deles, Antonio Ildefonso Gomes, o primeiro documento em solo brasileiro dirigido ao Congresso Nacional, solicitando, por escrito, a restrição da escravidão.
Em 1844, Benoit Mure, funda a Escola de Homeopatia do Rio de Janeiro, que deu suporte para a fundação mais tarde, oficialmente em 1859, do Instituto Hahnemanniano do Brasil.
Mure, arrojado em seus pensamentos e determinado em mudar o “status quo” vigente, acredita que o desenvolvimento científico somente caracteriza-se de fato como evolução, quando há progresso ético concomitante. Isso demonstra porque ocupou um espaço significativo no contexto sócio-científico do Brasil na época que esteve aqui.
Medicina popular
Mure é contra o elitismo da medicina e entra de cabeça contra as estruturas enrijecidas da época. Difunde a nova arte de curar aos 4 cantos, priorizando as ideias altruístas à semelhança de seu Mestre Hahnemann. Em seus projetos é terminantemente contra as práticas exclusoras incluindo em suas metas o tratamento dos escravos e das classes sociais menos abastadas que não tinham acesso à medicina da elite (corte). E de fato, a homeopatia foi, sem dúvida, durante todo o período da escravatura, uma das únicas práticas terapêuticas usada pelos escravos, haja vista que esta arte de curar, englobava duas qualidades fundamentais: eficiência e baixo custo.
O bandeirante da homeopatia no Brasil, sabia que precisava do apoio político e o endosso acadêmico da época para angariar mais solidez e estabilidade para a homeopatia. Tensionava obter parecer favorável da academia para a implantação da homeopatia e efetivamente consegue, entretanto, todo o recurso midiático que lhe serviu de suporte para o apoio político, infelizmente serviu de base para a perfídia que lhe alcançou mais tarde, pagando um alto preço. Os jornais, em especial o Diário do Comércio são então palcos de discussões fervorosas e a homeopatia é polemizada em toda pátria brasileira.
O médico brasileiro, Duque Estrada foi o primeiro a utilizar a homeopatia no tratamento da população, e com propriedade defende o tratamento homeopático para o tratamento contra a epidemia da febre amarela, inclusive reivindicando à criação de uma enfermaria para tratamento homeopático. Alguns como o senador Vasconcelos foi favorável a abolição da medicina oficial, afirmando que “toda liberdade deve ser dada ao médico para curar pelo sistema de sua escolha” (Carvalho, 1857).
Infelizmente a tão sonhada colônia societária do Sahy não se estabeleceu, entretanto, Mure direciona seus esforços à difusão da homeopatia, como promessa não menos áurea e altruísta difundindo-a em vários estados do Brasil. Nesse intento, reune seus colaboradores no intuito de expandir a homeopatia e em 1847, cria a Sociedade Homeopática Bahiana, Filia do Instituto Homeopático do Brasil.
Recursos para Homeopatia
Os recursos para investir na divulgação da homeopatia, a princípio, parecem ter vindo da fortuna pessoal que Mure trouxe para o Pais como herança. Foram inaugurados no final de 1847 um Hospital Homeopático, sob a presidência de Duque Estrada e também muitos outros consultórios populares foram abertos no Rio de Janeiro e Salvador. Os consultórios gratuitos, criados pelos homeopatas em 1843, foram um sucesso, com grande aceitação pela população, tanto que a Academia Imperial de Medicina, também resolveu abri-los em 1848.
Devido aos exaustivos embates, Mure tem sua saúde abalada e pede exoneração do cargo de diretor da Escola Homeopática do Brasil e deixa o Brasil, em abril de 1848. João Vicente Martins, seu inseparável amigo e confidente, assumiu a Escola Homeopática, reestruturou-a dando-lhe um corpo curricular mais arrojado. Mure morre no Cairo, após 10 anos de sua partida do Brasil (1858), e daí então surgem várias outras organizações homeopáticas como a Sociedade Hahnemanniana e a Academia Médico-Homeopática. As publicações clássicas e originais também aumentam a partir dessa fase e a homeopatia cresce rapidamente impulsionada e subsidiada pelo Instituto Hahnemanniano do Brasil. Como consequência, outros estados também são aquinhoados com mais informações acerca da Ciência da Homeopatia.
Estudos patogenésicos inéditos
Vários naturalistas catalogaram parte da flora e fauna do Brasil, a exemplo pode-se ressaltar os Holandeses Piso e Marcgrave (participaram do grupo de Maurício de Nassau), de Saint-Hilaire, dos botânicos Spix e Martius e de outros de menor importância como Freire Alemão, Velloso, Almeida Pinto, Caminhoá e Peckolt. Entretanto, é imperativo reconhecer que também Mure contribui significativamente com seus estudos da fauna e da flora de nosso País, inclusive indo mais além do que uma simples catalogação farmacodinâmica/farmacognósica. Estuda, além dos efeitos medicinais e de indicações terapêuticas das substâncias obtidas da medicina indígena e popular, dirige e coordena a apresentação de medicamentos, inéditos, crendo na prodigalidade de uma natureza generosa que oferece meios curativos localizados próximo dos povos que deles os necessitam (Rosembaum, 2002) http://homeoint.org/articles/portugues/mure.htm).
Em seus estudos, Mure apresenta resultados de sintomas obtidos após vasta experiência metódica, utilizando-se como norteador das instruções e recomendações de Hahnemann quando adota os critérios de estudos dos efeitos das substâncias sobre o homem, em que são registradas as observações dos efeitos das substâncias administradas. Esse trabalho experimental, não deve ser considerado apenas no seu aspecto histórico, mas sim com real uso como instrumento terapêutico e ainda de cunho inédito. Por conseguinte, o trabalho desse idealista e incansável bandeirante da homeopatia, é de considerável mérito, haja vista que pesquisas modernas buscam novas substância medicinais nas nossas florestas tropicais, e o Instituto Homeopático do Brasil já o fazia desde 1843.
Os esforços do trabalho de experimentação podem ser verificados no livro “Patogenesia Brasileira”, dos autores Mure e João Vicente Martins, onde se comprova o esforço de pessoas realmente comprometidas na busca de uma medicina para todos. Nesse material, organizaram uma matéria médica genuinamente brasileira com elementos obtidos dos reinos da natureza, alguns deles inéditos, ou apenas catalogados por outros pesquisadores além mar.